A minha ideia eras vir aqui num instantinho escrever qualquer coisa antes de me retirar para os aposentos e ver mais uma parte do Padrinho-parte II, mas esqueci-me de pensar no que seria essa tal coisa sobre a qual poderia, ou deveria, escrever.
Não tendo nada de importante ou essencial para dizer, gostava de confessar aqui uma fobia absolutamente ridícula, mas que não deixa de ser fobia, e por isso vou descrevê-la na esperança de a conseguir ultrapassar. A questão é que, movida por um egocentrismo descabido (eu não acho que seja egocêntrica, mas o que vou dizer a seguir nunca poderia vir de uma pessoa que não é egocêntrica, acho eu, portanto se calhar tenho de me olhar ao espelho com realismo e admitir que talvez seja, precisamente, egocêntrica), dizia, movida por um egocentrismo bastante estúpido no meu caso, porque não sou daquelas pessoas que faz a Terra girar, limitando-me a acompanhar o seu movimento de rotação e a contentar-me com isso - a propósito, interrompo para dizer que esta noite os meus vizinhos estão pior do que nunca, berram em voz rouca, que impressão, será que devo chamar a polícia?, se ouvir o som de objectos arrastados ou a partir, chamo - dizia, como sou egocêntrica, tenho um bocado a mania que as pessoas me perseguem. Por exemplo, noutro dia estava muito bem a andar na rua e encontro uma rapariga que não via desde a escola; ela diz-me olá e pergunta-me se eu "ainda estou a trabalhar em sítio x, com a pessoa y". Fiquei para morrer. Como é que ela sabe onde é que eu trabalho, e com quem trabalho?! E, se ela sabe, quem mais saberá, e como?! E se sabem onde moro? O que é que eu faço?
Depois acalmei-me, pensei que é mesmo assim, afinal há listas telefónicas, há internet, é facílimo hoje em dia encontrar registos, abundantes até, das pessoas, não se pode andar aí com medo que os outros descubram coisas da nossa vida, além de que o homem é um animal social, não nasceu só para lutar e para guerrear, como dizia o Miguel Guilherme no filme do Oliveira, mas também para socializar. Mas eu tenho medo, porque o conceito de "socializar" é, para mim, uma espada de dois gumes, e ainda não decidi se é nefasto, se é benéfico. Para mim, o Big Brother está em todo o lado, promovido por este ensejo de "socializar por aí", e não é só no meu caso; toda a gente, hoje em dia, é permanentemente perseguida.
Se ando na rua, só peço para não encontrar ninguém conhecido, que é para não me andarem a espiar. E eu que sempre me esforcei por conhecer o menor número de pessoas possível, para não ter de me chatear. Uma pessoa a esforçar-se e depois é isto. Há câmaras por todo o lado. Mesmo que se fuja para Londres, em Londres somos filmados 500 vezes em 5 metros, eu sei lá se quem vai ver as imagens das câmaras não é uma pessoa que eu até conheço - o mundo é pequeno, uma vez um amigo que vivia em Londres pôs-se a conversar com o rapaz do clube de vídeo onde ele ia, que por acaso era português, e, conversa puxa conversa, descobriu que o rapaz do clube de vídeo me conhecia do jardim de infância. Jardim de infância! Não consigo encontrar exemplo mais paradigmático do que este.
Eh pá, pensando bem, se calhar não é nada boa ideia ter um blog. Eu sei lá. A gente nunca sabe. Se calhar o melhor é mesmo tornar-me eremita; por acaso, sempre pensei que era uma carreira profissional interessante para mim, e é daquelas em que o mal-fadado e famigerado "socializar" não se exige nem é pré-requisito, pelo contrário. Será que, sendo eremita, conseguimos apagar os traços que deixamos, todos os dias, atrás de nós a marcar a nossa presença? Ou serão estas pegadas indeléveis, e todo o ser humano marca inevitável e eternamente os sítios e as pessoas que, brevemente ou não, fizeram parte da sua vida?
É muita filosofia para a minha pobre cabeça.
Os vizinhos já se calaram.
2 comentários:
Olá, qual blogue qual carapuça! Bronquiolite num, atenção a outro, sono, ansiedade por emprego, enfim, o resto fica, o tempo passa, eu envelheço, mas enfim, é bom viver intensamente! Beijos ó estampada!
No teu caso é muito boa ideia ter um blog :)
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