Como as terças-feiras são os dias malditos da minha semana, trabalho demais e verifico que penso, também, demais. Nesta terça-feira em particular, pus-me a pensar que, muitas vezes, sou verdadeiramente um fantasma, a flutuar por aí, sem nenhuma verdadeira relação com o mundo. No entanto, tenho, na verdade, uma imensa relação com o mundo, pois basta ter de trabalhar para viver para fazer de mim uma peça nessa grande engrenagem que é a vida na sociedade ocidental, trabalhar, trabalhar, pagar contas, etc. Como dizia Marx, de facto tudo depende das condições materiais das pessoas, e não controlar os meios de produção é terrível porque ficamos alienados. E é isso que me acontece, passo os dias alienada porque tenho de vender os meus meios de produção, e ainda não descobri como é que posso viver de forma independente sem os vender e sem ter de me sujeitar ao preço que o mercado me dá pelas minhas capacidades.
Dantes, tinha uma âncora que me ligava à terra, a minha querida amiga D., que teve de se mudar e foi viver para longe (mas a culpa não foi minha; ela não se mudou por minha causa, não tive nada a ver com isso, mudou-se porque teve de ser). A D. é que me informava das coisas que se iam passando na nossa terra, porque já sabia que eu nunca sabia nada ("olha que a loja tal já não é ali, olha que agora para tratares do assunto y tens de ir ao sítio x", etc.). Aliás, a D. continua a informar-me de tudo, porque, não sei bem como é que ela faz, mas consegue estar sempre informadíssima acerca do que se passa, apesar de estar a quilómetros e quilómetros de distância. Eu, porém, continuo a viver no mesmo sítio e passa-me sempre tudo ao lado. Leio o jornal sempre atrasado, nunca apanho nada a tempo, ando sempre a perder coisas interessantíssimas. Se não tivesse alguns amigos que se compadecem da minha situação, perdia mesmo tudo. Nem sei o que me restava, restar-me-ia apenas tempo para pensar em parvoíces.
Eu tento não ser assim, mas a verdade é que não sei como é que se consegue ser daquelas pessoas activas, que sabem sempre tudo, que no princípio da semana já têm a vida organizada até sexta-feira e que no Domingo, como canta o Jorge Palma, sabem de cor o que vão dizer segunda-feira. Eu nem me importava de saber de cor o que vou dizer segunda-feira. Era melhor do que ter aquela música cruel do Simon & Garfunkel, "I touch no one and no one touches me", a matraquear na cabecinha. Não é nada agradável.
Talvez a coisa se resolva se eu deixar de ler o jornal atrasado e passar a lê-lo actualizado, se eu prestar mais atenção aos anúncios, se ler os folhetos que às vezes se distribuem na rua, se, se, se. Mas para quê?
2 comentários:
O Carlos Marques sabia bem do que dizia. Mas não vamos levar as suas palavras muito à risca, ou acabamos como a Ilda Figueiredo e o Jerónimo de Sousa, com os direitos dos trabalhadores da Marinha Grande e etc.
Ou melhor, sem etc., que os argumentos acabam por aí...
Zorze, é isso, o Carlos Marques sabia muito bem o que andava a dizer. Assustadoramente bem, até.
Mas enfim, vivendo e aprendendo.
E olha, vamo-nos encontrar em breve, não é? Já estou a par dos planos todos, eh eh. :)
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