segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Telefonas ao papá e ele orienta-te

A Lena Dunham, ao que parece, é o sucesso do momento e tem uma série chamada Girls, já de grande popularidade; antes da mesma série escreveu e realizou um filme indie denominado Tiny Furniture. Vi o filme e um episódio da série e não tenho muita coisa a dizer que não argumentos que outros já escreveram - não fiquei convencida porque tanto em filme como em televisão tudo aquilo me parece um relato pouco interessante de miúdos sem grande coisa a dizer. 
Fala-se da Lena Dunham, que tem uma beleza tão pouco convencional e mesmo assim faz imensas cenas de sexo, e de como os encontros sexuais são esquisitos, frios, sem aquela magia do cinema a que estamos habituados, e de como o não encontrar emprego e depender dos pais e tentar encontrar um caminho na vida são temas tão realistas e tão bem desenvolvidos, talvez porque aquilo que escreve tenha um veio muito autobiográfico.
Eu achei que não, que não eram temas bem desenvolvidos. Esta Lena não tem culpa de ter nascido num meio cosmopolita privilegiado, com dinheiro, com amigos artísticos e tal. Não só não tem culpa, como é de louvar que uma pessoa com, aparentamente, tão poucas preocupações tenha tido o empreendedorismo e o talento de transformar a sua vidinha em produtos mediáticos que agora lhe dão dinheiro (imagino que já não viva com os pais). Mas a verdade é que não consegue dizer grande coisa que se aproveite, nem ela nem as personagens que ela inventa, ou em quem se baseia. 
Não digo que a única ficção sólida e digna de elogio seja o "kitchen sink drama" à Ken Loach ou neo-realismo italiano ou coisa que o valha. Apareceu por aí um filmito há uns tempos, "Fish Tank", sobre a adolescente alienada e pobrezinha dos bairros sociais ingleses, que parecia muito decente mas que também não era nada de especial. 
Aquilo a que quero chegar, penso, é que um filme, ou uma série, ou um livro que valha o nosso esforço e atenção tem de ter alguma honestidade que compense a sua eventual superficialidade ou vacuidade. E os Pulp cantam uma coisa muito importante e que explica isto - "you'll never live like common people, because when you're in bed at night, watching roaches climb the wall, if you call your dad, he can stop it all". E aquilo que os Pulp dizem é absolutamente verdadeiro e eloquente, quanto a mim. 

PS - o poster é um ataque fácil, eu sei, mas achei tanta piada que tive de postar aqui. E também deixo a cançãozinha dos Pulp porque gosto tanto dela que não resisto. Bem haja.

Livros fáceis e difíceis

Meu Deus, dois meses e tal sem escrever. Ah, vida, erros meus, amor ardente. São estes os culpados, já dizia Camões.
Bom, passando ao que interessa. O Guardian tem uma lista daqueles que são considerados os livros mais difíceis de ler, com base nos critérios que a seguir se enunciam: "their length, or their syntax and style, or their structural and generic strangeness, or their odd experimental techniques, or their abstraction". 
De modo que, na mesma lista, figuram obras como A Fenomenologia do Espírito, de Hegel, e To the Lighthouse, da Virginia Woolf, entre outros. Curiosamente, o Ulysses não consta, embora Finnegan's Wake lá esteja. Nunca li nem um nem outro, mas não duvido que sejam dificílimos. 
E porém. Isto de um livro ser "fácil" ou "difícil" é uma coisa estranha e ambígua, especialmente se atentarmos apenas a critérios formais, como o são essas entidades amaldiçoadas tipo "sintaxe", "estilo", "técnicas". A abstracção também é traiçoeira. Um dos livros mais fáceis (e piores) que li, The Awakening, da Kate Chopin, tinha alguma abstracção. A cena final até é digna de ser descrita como condignamente abstracta. Pelo menos simbólica, vá. 
A minha ideia principal é que o livro normalmente apelidado de "fácil" é enganoso, porque na verdade não é fácil, é difícil. Ler Paulo Coelho é difícil porque é seca. Conclusão: os livros de Paulo Coelho são difíceis. Também li uma vez um livro da Rita Ferro e considero que foi dos mais difíceis que li, porque era tão chato que não consegui acabar. Resultado: os livros de Rita Ferro são difíceis. 
E venham agora dizer que os meus exemplos são tão lugares-comuns que até faz impressão, olha esta parva a dizer mal de Paulo Coelho e Rita Ferro e Nicholas Sparks, que exemplos tão estafados, só lhe falta incluir a Margarida Pinto Rebelo. Desta, não li os livros, mas li uma crónica(zeca) que andou por aí a circular sobre  as "gordas" e devo dizer que foi muito difícil de ler. Foi penoso, digamos. Mas dou outros exemplos - sobre um dos livros mencionados na lista, To the Lighthouse, posso comentar porque li, e poderei talvez dizer que é difícil, mas não necessariamente pela sintaxe, ou abstracção, ou experimentação técnica. Achei difícil porque não gostei muito, penso que foi mais isso. A nível técnico, não considero que haja algum leitor que leia este livro e seja incapaz de perceber pelo menos alguma coisinha do que lá se passa - não desmerece em nada a obra, até a engrandece, penso; a conclusão a que quero chegar é que um livro não é fácil ou difícil pelos seus aspectos formais, tirando algumas excepções como o Som e a Fúria - um livro que dá vontade de ler mas que, pelo menos até chegarmos mais ou menos a metade, cria resistência por ser difícil. O mesmo se poderá dizer de Waste Land, propositadamente escrito para ser "difícil", e de certa forma é - mas acaba por não ser, se insistirmos e conseguirmos decifrar o código.
E de livros fáceis e propósito de códigos, o que podemos dizer? O Código Da Vinci não me custou a ler. Até li bastante bem e achei divertido (exceptuando o final, que é muito preguiçoso e estúpido). O homem (Dan Brown) pode ser um mentiroso ganancioso, mas o livro lê-se bem. Este sim, é um livro fácil.
Os livros da PD James, que eu adoro, são fáceis de ler, e não é por isso que são maus. À partida, qualquer bom livro devia ser igualmente um livro fácil porque atrai o leitor - e daí eu não concordar necessariamente com os critérios formais que definem livros fáceis e difíceis.
E foi isto que eu consegui arranjar para, ponto um, voltar a escrever, ponto dois, distrair-me do massacre que ocorre no mundo e no país, que me deixa tolhida e incapaz de fazer coisas. Como quero voltar a fazer coisas, voltei a escrever aqui.
Obrigada e boa continuação. Boa noite e boa sorte. Até a uma próxima.