quinta-feira, 4 de março de 2010

Petals on a wet, black bough


Hoje aconteceu-me uma coisa tão estranha.
Estava a tomar café e a ler o jornal. É uma combinação que me agrada, café e jornal.
Bom. Acabei de ler o jornal, acabei o café (tenho o péssimo hábito de beber café a correr, a queimar-me a língua; a minha mãe, grande apreciadora e perita em matéria de café, diz que isso é sinal de quem é novato nestas andanças e não aprendeu, ainda, a equilibrar a curteza de uma bica com o tempo que é preciso para a apreciar verdadeiramente; ora, eu bebo café há mais de dez anos e a verdade é que, de facto, nunca consegui dominar bem esta técnica. Tenho medo que fique frio de repente e então bebo-o logo de enfiada, assim que tenho a chávena nas mãos). Adiante. Levantei-me para pagar e, à minha frente na caixa, estava uma rapariga (ou senhora - lá está, nunca sei), mas enfim, estava uma rapariga à minha frente que olha para mim e me dirige um sorriso imenso, aberto, e esboça um "olá". Como se me conhecesse.
A questão era: eu tinha uma vaga ideia de conhecer aquela cara. Vaguíssima, desvanecida, apagada quase à extinção, e não me conseguia lembrar de todo se a conhecia de facto, ou não.
A rapariga continuava a sorrir. Parecia tão contente por me ver. E eu fiquei especada, a tentar sorrir, mas de certeza a fazer cara de parva, e só pensava "se eu lhe perguntar 'mas eu conheço-a de algum lado?', vou ser muitíssimo mal-educada, não posso de todo dirigir-me a ela assim". De modo que decidi ficar ali a fazer figura de parva, de meio sorriso posto, até ela me deixar passar à frente e eu pagar a despesa.
Depois, agarrei no jornal, de cabeça baixa, a fingir que o estava a ler, para poder sair do café rapidamente sem ter de encarar novamente a rapariga. Que feio.
O sorriso dela era mesmo simpático. Parecia o sorriso de alguém que gosta de nós.
Mas será possível eu ter conhecido uma pessoa assim e não me conseguir lembrar?

2 comentários:

fado alexandrino. disse...

Este post deu-me imenso trabalho.
E vou escrever ao mesmo tempo que vejo Herbie Hancock no Mezzo, uma mistura explosiva.
Está muito bem escrito, uma naturalidade, mas o que me intrigou foi o título.
Fui procurar e percebi.
Bem dizer que percebi é um bocadinho exagerado, o assunto não é assim tão simples para um simples.

Rita F. disse...

Herbie Hancock, que bem! :)
Eu gosto muito do poemazinho do Ezra Pound. Lembrei-me dele quando vi o sorriso da rapariga.
Ainda não me consegui lembrar dela. Devia ter-lhe dito alguma coisa.