quinta-feira, 17 de junho de 2010

Contra o tu

Hoje passaram-se várias coisas durante o meu almoço. De vário tipo e de vária ordem.
Eu e a minha amiga L. discutimos a tal questão do Código Da Vinci vs. Pêndulo de Foucault, mas antes disso, tivemos de ficar à espera de mesa. Era um daqueles restaurantezinhos (ou restaurantezecos?) pequenos, de hora de almoço, que tem sempre movimento e também a vantagem de ser baratinho (ou barateco?).
Bom. Eu perguntei ao senhor - "desculpe, podemos sentar-nos naquela mesa?", ao que ele respondeu "deixa-me limpar primeiro".
Deixa-me. E disse mais qualquer coisa recorrendo a este fenómeno desagradável que é a segunda pessoa do singular.
Eu tenho a ligeira convicção de que o tu e a segunda do singular deviam mais ou menos ser omitidos das gramáticas que se dão a pessoas que têm estabelecimentos públicos. Estas pessoas deviam aprender uma gramática especial, só para elas, em que não figurasse o "tu". É discriminação? Pois sim.
Se esta medida é discriminação, paciência. A verdade é que nem crianças de uma certa idade (mais crescidinhas) deveriam ser sujeitas ao tu quando vão às lojas (relativamente ao tratamento de crianças em lojas, nem me aventuro a dissertar - o pessoal das lojas tem de se decidir, porque ou enlouquecem à vista de uma criança, ou ignoram-na completamente, e lá fica ela de moedinha ao balcão, como eu já vi, a tentar pagar o café do pai).
Eu sei bem que há muitos falantes de língua portuguesa que acham que devíamos ser mais como os espanhóis, mais informais, muito tu para aqui e para acolá - eu respeito esta posição porque, se de facto fosse próprio da língua portuguesa usar naturalmente o tu, nada teria contra. Mas a verdade é que não é. A verdade é que, socialmente, é mais neutro (nem vou dizer mais bem-educado; digo só mais neutro) preferir a terceira pessoa do singular ao "tu". Não vale a pena dizer, "ah, vamos usar todos o tu", quando ninguém usa. É forçado. Fere o ouvidinho. Se estiver em Espanha e me tratarem por tu, não me passa pela cabela começar a "mandar vir" (bela expressão); a norma é assim e pronto. Mas o que é certo é que eu vivo em Portugal, onde o tu não é muito aceitável, a não ser que se trate da nossa família ou dos nossos amigos.
Pronto, ok, admito, retracto-me, faço todos os mea culpa e mais alguns - posso ser conservadorazeca, reaccionariazeca, tudo muito -eco, mas a verdade é que o tu me aborrece verdadeiramente. Aborrece. É foleiro. Foleireco.

6 comentários:

C disse...

Confesso-te que também fico doente quando me tratam por tu sem me conhecerem de lado algum. Naturalmente trato sempre as pessoas por você (mesmo as mais novas do que eu), até que elas me dizerem que preferem o "Tu" e neste caso nem sempre consigo fazer o switch para este "modo".
Acho que a boa educação cabe em qualquer lado...

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Lita

Rita F. disse...

Eu até gostaria do "tu" se, de facto, se tornasse mais comum. Mas como não é muito comum entre desconhecidos, soa mal.

fado alexandrino. disse...

Peço muita desculpa a ambas, mas a coisa mais vil é quando me tratam por você.
Considero mesmo insultuoso e até prefiro o "tu" que graciosamente corrijo logo a seguir.
O senhor, a senhora, o menino, a menina, olhe faz favor, é assim que deve ser.
Outra coisa que me aborrece ( e ainda bem que a venda de armas não é livre em Portugal) é um "você" que no meu ginásio quando vêm da aula desata a assobiar alto e bom som.
Ele não sabe mas é de muito má educação.
Quem me disse isto ao almoço (não foi hoje) foi a Paula Bobone.
Ele e eu não sabemos quem foi o autor do livro que o Brown copiou.

lenor disse...

Quando comecei a ler o post aquele "Deixa-me limpar a mesa." pareceu-me só uma frase imcompleta. E ainda parece. Ele teria querido dizer, como se falasse para si próprio: "Deixa-me cá limpar a mesa."
Há coisas que só vistas e ouvidas se acredita! Desculpai lá.

Zorze disse...

Vá lá, não apanhaste com um "que é que queres?"...

Tolan disse...

Sinto exactamente a mesma coisa. A piada é quando visto um fato e gravata, nunca me tratam por tu. Ah, e já dei uma descompostura a um amigo meu que tem a mania de tratar os empregados por tu porque acha, genuinamente, que eles até preferem.