Eu sou completamente a favor da felicidade, da alegria e até do optimismo, embora possa parecer que não. Mas a verdade é que sou.
No entanto, considero que há momentos na vida em que a tristeza é inevitável e assumi-la também. Por exemplo, tenho notado que, nos últimos tempos, têm-se sucedido notícias sobre pessoas que conheço vagamente e que se separaram ou divorciaram. Como as rupturas, quaisquer que sejam, mas principalmente as amorosas, são coisas que verdadeiramente me deixam aterrada, fico sempre cheia de pena, e indago acerca do estado de espírito da pessoa ("ah, mas ele/ela está bem? anda a trabalhar muito, ao menos, para conseguir esquecer?", sei lá, coisas parvas desta índole). Fico sempre abismada com as respostas que recebo. Uma semana depois do desgosto e já toda a gente mudou de emprego para se encontrar agora a ganhar €300000 por mês, ou já se casaram novamente, ou já apresentaram namorado novo aos pais, ou vão ter um bebé com o namorado/a novo/a, ou foram convidados para ir viver para a Califórnia como estrelas de cinema, etc., etc.
Admiro quem tem esta elasticidade para deixar que os azares da vida embatam neles para fazerem ricochete, superando rapidamente obstáculos e voltando a repor a ordem natural das coisas, que deve ser feliz. E porém, a rapidez com que as pessoas escamoteiam a tristeza é algo que me surpreende sempre. Não ouço falar de ninguém que fique em casa a chorar, que tenha dificuldade em manter uma vida normal, que admita que está infeliz. É evidente que muitos preferem esconder estados de espírito e adoptar uma fachada de alegria e força para o mundo exterior, o que é legítimo. Mas, mesmo em conversas pessoais que vou tendo, constato que a infelicidade e a tristeza são cada vez mais palavras proibidas no léxico de toda a gente.
Se eliminar os vocábulos "infelicidade" e "tristeza" equivalesse a erradicá-los definitivamente da vida das pessoas, estaríamos todos de acordo. Mas não nomear uma coisa não quer dizer que ela não exista. É impossível viver sem que, com grande pena minha e de toda a gente, sejamos atingidos por ondas negras de tristeza. É mesmo assim. Um bom método talvez seja chorar tudo o que há para chorar, resolver todos os lutos antes que eles se avolumem ainda mais. E isto não sou eu que digo - já há muito que se sabe do poder das lágrimas. Leia-se, interessantemente, o que diz José Tolentino Mendonça na sua introdução a O Dom das Lágrimas. Orações da antiga liturgia cristã, Assírio e Alvim, p.12:
Temos muitas maneiras de chorar, e o modo como o fazemos revela não só a temperatura dos sentimentos, mas a natureza da própria sensibilidade. Ao chorar, mesmo na solidão mais estrita, dirigimo-nos a alguém: esforçamo-nos para que ninguém veja que choramos, mas choramos sempre para um outro ver. As lágrimas emprestam um realismo único, irresistível à dramática expressão de nós próprios. São um traço tão pessoal como o olhar ou o mover-se ou o amar.
Choramos pouco, não é? A não ser as velhotas- "eu-sou-uma-pessoa-doente" que de vez em quando aparecem na televisão (e não dão vontade nenhuma de rir, apesar de eu estar a falar disto descontraidamente), as pessoas não choram muito. E, se choram em privado, nunca dizem que choram. Isso é com elas, de facto, não me cabe a mim especular o porquê.
Mas pronto. Isto sou só eu a falar. Eu nem nunca chorei na vida e detesto, verdadeiramente, que chorem ao pé de mim, de modo que não sou pessoa para estar aqui a pregar sermões.
Admiro quem tem esta elasticidade para deixar que os azares da vida embatam neles para fazerem ricochete, superando rapidamente obstáculos e voltando a repor a ordem natural das coisas, que deve ser feliz. E porém, a rapidez com que as pessoas escamoteiam a tristeza é algo que me surpreende sempre. Não ouço falar de ninguém que fique em casa a chorar, que tenha dificuldade em manter uma vida normal, que admita que está infeliz. É evidente que muitos preferem esconder estados de espírito e adoptar uma fachada de alegria e força para o mundo exterior, o que é legítimo. Mas, mesmo em conversas pessoais que vou tendo, constato que a infelicidade e a tristeza são cada vez mais palavras proibidas no léxico de toda a gente.
Se eliminar os vocábulos "infelicidade" e "tristeza" equivalesse a erradicá-los definitivamente da vida das pessoas, estaríamos todos de acordo. Mas não nomear uma coisa não quer dizer que ela não exista. É impossível viver sem que, com grande pena minha e de toda a gente, sejamos atingidos por ondas negras de tristeza. É mesmo assim. Um bom método talvez seja chorar tudo o que há para chorar, resolver todos os lutos antes que eles se avolumem ainda mais. E isto não sou eu que digo - já há muito que se sabe do poder das lágrimas. Leia-se, interessantemente, o que diz José Tolentino Mendonça na sua introdução a O Dom das Lágrimas. Orações da antiga liturgia cristã, Assírio e Alvim, p.12:
Temos muitas maneiras de chorar, e o modo como o fazemos revela não só a temperatura dos sentimentos, mas a natureza da própria sensibilidade. Ao chorar, mesmo na solidão mais estrita, dirigimo-nos a alguém: esforçamo-nos para que ninguém veja que choramos, mas choramos sempre para um outro ver. As lágrimas emprestam um realismo único, irresistível à dramática expressão de nós próprios. São um traço tão pessoal como o olhar ou o mover-se ou o amar.
Choramos pouco, não é? A não ser as velhotas- "eu-sou-uma-pessoa-doente" que de vez em quando aparecem na televisão (e não dão vontade nenhuma de rir, apesar de eu estar a falar disto descontraidamente), as pessoas não choram muito. E, se choram em privado, nunca dizem que choram. Isso é com elas, de facto, não me cabe a mim especular o porquê.
Mas pronto. Isto sou só eu a falar. Eu nem nunca chorei na vida e detesto, verdadeiramente, que chorem ao pé de mim, de modo que não sou pessoa para estar aqui a pregar sermões.