Eu sei que esta história facilmente se encaixa numa dessas tragédias do quotidiano que gostamos de ignorar por nos sentirmos superiores aos tabloids: mãe e filha que apanham um táxi para junto da linha ferroviária, põem a cabeça nos carris e esperam pacientemente pelo comboio que as irá decapitar. E eu poderia dizer que esta tragédia do quotidiano me arrepia, e como é terrível que isto aconteça, e etc. e tal. E de facto todos estes lugares-comuns são verdadeiros. É arrepiante, e todos os pormenores desta tragédia do quotiano são arrepiantes e gélidos, o pormernor do táxi, o pormenor de sairem de casa para apanharem o táxi para a morte. Tudo o que escrevo é um imenso lugar comum, e no entanto tão perturbador.
Não sei por que se mataram as senhoras, mas o que a mim me parece certo, de relevo, nesta tragédia do quotidiano, tão pronta a alimentar a avidez do tabloid e pasquim, é a solidão. "Não têm nenhum familiar próximo". "Os corpos ainda não foram reclamados".
No excelente concerto de ontem, Leonard Cohen, nas suas palavras de despedida, disse ao público que esperava reencontrá-lo na companhia de familiares e amigos, mas que, se não fosse essa a sua situação, então que estivesse em paz com a sua solidão. E, de facto, a solidão, tão primordial no ser humano, é também a sua grande tragédia. Os outros são a nossa única hipótese de uma escassa salvação possível. E quando não temos os "outros" na nossa vida?
Uma coisa é estar só. Outra é estar desamparado. Ainda outra, provavelmente desesperante, é estar só e desamparado. A solidão suporta-se. Penso até que a solidão é incompreendida - toda a gente a encara como uma tragédia, quando pode ser um benefício. Mas o desamparo é irredutível, trágico.
A minha mãe diz-me que a Hannah Arendt escreveu sobre isto. Tenho de ir ler.
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