sexta-feira, 31 de julho de 2009

Por mim, ninguém já se detém na estrada


Eu sei que esta história facilmente se encaixa numa dessas tragédias do quotidiano que gostamos de ignorar por nos sentirmos superiores aos tabloids: mãe e filha que apanham um táxi para junto da linha ferroviária, põem a cabeça nos carris e esperam pacientemente pelo comboio que as irá decapitar. E eu poderia dizer que esta tragédia do quotidiano me arrepia, e como é terrível que isto aconteça, e etc. e tal. E de facto todos estes lugares-comuns são verdadeiros. É arrepiante, e todos os pormenores desta tragédia do quotiano são arrepiantes e gélidos, o pormernor do táxi, o pormenor de sairem de casa para apanharem o táxi para a morte. Tudo o que escrevo é um imenso lugar comum, e no entanto tão perturbador.
Não sei por que se mataram as senhoras, mas o que a mim me parece certo, de relevo, nesta tragédia do quotidiano, tão pronta a alimentar a avidez do tabloid e pasquim, é a solidão. "Não têm nenhum familiar próximo". "Os corpos ainda não foram reclamados".
No excelente concerto de ontem, Leonard Cohen, nas suas palavras de despedida, disse ao público que esperava reencontrá-lo na companhia de familiares e amigos, mas que, se não fosse essa a sua situação, então que estivesse em paz com a sua solidão. E, de facto, a solidão, tão primordial no ser humano, é também a sua grande tragédia. Os outros são a nossa única hipótese de uma escassa salvação possível. E quando não temos os "outros" na nossa vida?
Uma coisa é estar só. Outra é estar desamparado. Ainda outra, provavelmente desesperante, é estar só e desamparado. A solidão suporta-se. Penso até que a solidão é incompreendida - toda a gente a encara como uma tragédia, quando pode ser um benefício. Mas o desamparo é irredutível, trágico.
A minha mãe diz-me que a Hannah Arendt escreveu sobre isto. Tenho de ir ler.

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