A Edit Piaf tem uma canção que eu adoro, que ouço em repeat até mais não poder, e que se chama Les Amants D'Un Jour. A narradora é uma rapariga que trabalha num hotel em que se alugam quartos baratos, e que limpa os copos ao fundo do café (do hotel, presumo eu), como ela diz logo nos versos iniciais. A canção é a história dos tais amantes por um dia e que esta rapariga recorda, num tom muito melancólico. Num dos versos da canção, diz a narradora que y avait tant de soleil au fond de leurs yeux que ça m'a fait mal, que ça m'a fait mal...
Sempre achei muitíssimo comovente esta subtileza da solidão da narradora, quando confrontada com o sol radioso do amor dos outros. É que, de facto, constantar o afecto alheio é de uma melancolia entristecedora, quase de levar lágrimas ao olhos. Já escrevi antes os lugares-comuns do amor ser tão piroso, e de como é constrangedor ver pombinhos apaixonados, e isto e aquilo. Mas, quando nos deparamos com duas pessoas que parecem gostar uma da outra a sério, a constatação do amor é tão bonita que chega a ser triste. Para mim, é triste principalmente porque nunca acredito e tenho pena das pessoas. Tenho uma pena imensa, ponho-me a olhar para elas e a pensar, "o que será deste casal daqui a dez anos, gordos e feios, a levar os filhos para o centro comercial? Será que se vão lembrar desta tarde de sol, deste jardim, onde foram jovens, felizes, com um futuro que vai desaparecer tão depressa?", e foi exactamente o que pensei uma vez, numa tarde de chuva em Inglaterra (olha a novidade), ia eu para a biblioteca, e passa por mim uma rapariga alta a correr, com uns ténis Converse All Star impecáveis, e se lança nos braços de um tipo também alto e giro. Que lindos que eles eram, os dois. Talvez ainda se mantenham giros, não passou muito tempo desde essa altura. Mas daqui a 15 anos, quem sabe.
Quando vemos casais de uma certa idade, é, por vezes, tão difícil acreditar que também eles passaram pela felicidade pirosa do amor, que também eles palpitaram de emoção ao saber que naquele dia se iam encontrar, que também eles foram iluminados pelo tal "sol" do amor de que fala a canção da Edit Piaf. Há, em certos casais, de uma certa idade, um tédio tão grande, uma solidão que parece tão terrível. A solidão deve ser, de facto, ainda mais terrível quando se está com alguém.
É sempre no centro comercial que eu vejo estas pessoas. Tenho de deixar de ir a centros comerciais, venho de lá sempre com uma depressão monumental, de tanto casal e criança de ar amorfo que por lá pulula.
Eu acho que a piada acaba toda com o casamento. Sinceramente, a minha teoria é esta. Acho que é fácil viver muito amor, muito amor, muito entusiasmo, enquanto formos todos namorados e namoradas. Quando se assina o papel e o estado burguês e confortável do casamento invade a nossa vida, começa verdadeiramente o frango assado ao domingo, o centro comercial, o Seat ibiza, as crianças aos berros, etc. Faz-me muita aflição. Mas talvez esteja errada.
A canção da Edit Piaf acaba mal, os amantes matam-se.
Sempre achei muitíssimo comovente esta subtileza da solidão da narradora, quando confrontada com o sol radioso do amor dos outros. É que, de facto, constantar o afecto alheio é de uma melancolia entristecedora, quase de levar lágrimas ao olhos. Já escrevi antes os lugares-comuns do amor ser tão piroso, e de como é constrangedor ver pombinhos apaixonados, e isto e aquilo. Mas, quando nos deparamos com duas pessoas que parecem gostar uma da outra a sério, a constatação do amor é tão bonita que chega a ser triste. Para mim, é triste principalmente porque nunca acredito e tenho pena das pessoas. Tenho uma pena imensa, ponho-me a olhar para elas e a pensar, "o que será deste casal daqui a dez anos, gordos e feios, a levar os filhos para o centro comercial? Será que se vão lembrar desta tarde de sol, deste jardim, onde foram jovens, felizes, com um futuro que vai desaparecer tão depressa?", e foi exactamente o que pensei uma vez, numa tarde de chuva em Inglaterra (olha a novidade), ia eu para a biblioteca, e passa por mim uma rapariga alta a correr, com uns ténis Converse All Star impecáveis, e se lança nos braços de um tipo também alto e giro. Que lindos que eles eram, os dois. Talvez ainda se mantenham giros, não passou muito tempo desde essa altura. Mas daqui a 15 anos, quem sabe.
Quando vemos casais de uma certa idade, é, por vezes, tão difícil acreditar que também eles passaram pela felicidade pirosa do amor, que também eles palpitaram de emoção ao saber que naquele dia se iam encontrar, que também eles foram iluminados pelo tal "sol" do amor de que fala a canção da Edit Piaf. Há, em certos casais, de uma certa idade, um tédio tão grande, uma solidão que parece tão terrível. A solidão deve ser, de facto, ainda mais terrível quando se está com alguém.
É sempre no centro comercial que eu vejo estas pessoas. Tenho de deixar de ir a centros comerciais, venho de lá sempre com uma depressão monumental, de tanto casal e criança de ar amorfo que por lá pulula.
Eu acho que a piada acaba toda com o casamento. Sinceramente, a minha teoria é esta. Acho que é fácil viver muito amor, muito amor, muito entusiasmo, enquanto formos todos namorados e namoradas. Quando se assina o papel e o estado burguês e confortável do casamento invade a nossa vida, começa verdadeiramente o frango assado ao domingo, o centro comercial, o Seat ibiza, as crianças aos berros, etc. Faz-me muita aflição. Mas talvez esteja errada.
A canção da Edit Piaf acaba mal, os amantes matam-se.
2 comentários:
Se é verdade que quem pensa não casa e quem casa não pensa, não te vais casar. Isto é lógica, não é futurologia.
Pois é, uma lógica aristotélica com todo o sentido. Concordo. :)
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