quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Frágil

Às vezes fico tão farta de não saber as coisas. A pessoa esforça-se, esforça-se, esforça-se, e há sempre coisas que não sabe, que nunca vai saber, há sempre coisas incontroláveis que mudam tudo para pior (ou melhor, quem sabe), e entretanto estamos sempre na corda bamba, todos os dias, todas as horas. É tão cansativo, é exasperante, e enquanto se anda nisto há milhares de filmes que não vemos, milhares de livros que não lemos, dezenas pessoas que não conhecemos e que nunca vão cruzar o nosso caminho, dezenas de sítios a que nunca fomos e a que provavelmente nunca iremos, e um mundo inteiro fora do nosso alcance e onde se calhar as coisas são melhores, mais bonitas, enfim, não sabemos, mas também não vamos lá chegar.
E ponho-me a pensar amiúde que há dias em que vejo porcaria na televisão, e perco tempo na net sem fazer nada, sem me tornar melhor, mais sábia ou mais bonita, quanto muito fico mas é pior, e o tempo que perdi é irrecuperável e é terrível, é o preço a pagar por todos os pequenos, ínfimos erros de todos os dias, erros que podiam ser evitados e substituídos por mais livros, mais pessoas, mais sítios, livros que nunca leio, pessoas que nunca conheço, sítios a que nunca vou, e erros meus em minha perdição se conjuram, como cantava o Camões, erros tão pequeninos e que deviam ser insignificantes mas não são. Mas porque é que tudo na vida tem de ter uma consequência qualquer? É pouco justo.
E escrevo frases longas de mais, e cometo o mesmo erro ano após ano após ano. Entre outros. Errar é humano. Mas também é humano errar menos. Somos tão benevolentes para com a nossa própria pessoa, tão pouco exigentes. Ainda estou para conhecer quem não seja, e não digo isto por conhecer pouca gente. O ser humano é frágil, lá cantava o Jorge Palma.
De modo que hoje, o que eu precisava mesmo é que me pusessem o braço no ombro, eu preciso de alguém,  e embarco tanto em conversas banais, e sim, adorava mesmo estar in, mas não passo do out.
Que cousa, pá.

7 comentários:

Rita disse...

Isto não pode ser assim, só cá vir ler e não dar nada em troca. Aqui vai um bracinho. Um bracinho de uma ilustre desconhecida, mas uma desconhecida que aprecia as leituras.
Um a(bracinho),
Rita Correia

Anónimo disse...

Isso é algo que eu podia ter escrito. Não tão bem. Mas podia.
A parte boa é termos consciência disso.
A parte má é que daqui um mês, um ano, ..., podemos estar a relembrar que continuamos a fazer exactamente o mesmo. ;)

Catarina Barros disse...

bingo :)

Sara disse...

Li o texto com as lágrimas a crescerem nos olhos. Sinto precisamente o mesmo. Pena de não ser e saber mais. Pena de ter o tempo e a mania da perfeição a minarem tudo.

Gosto muito de a ler.

Rita F. disse...

É como diz o Kavafis, temos de pensar que o que interessa é a viagem, não é o destino. A viagem tem de correr bem para chegarmos a qualquer lado. Onde chegamos exactamente - não interessa assim tanto, e temos direito a uns quantos enganos no caminho.

Catarina Barros disse...

a Alice também diz isso numa conversa com o coelho, que não interessa muito por onde vais, desde que vás. qualquer coisa que soa a «o caminho faz-se a andar».

Petit Joe disse...

Ao ler este texto, pensei para mim, que por tantas vezes me encontro a desperdiçar o tempo e que a vida é tão curta que não terei tempo de ler tudo, de ver tudo.
Mas, sabe tão bem desperdiçar o tempo!