sábado, 31 de outubro de 2009

"A salvação divina, são os homens que a trazem"



E é assim, quando a escuridão aperta e tudo parece sem remédio, vê-se uma peça brilhante como esta e tudo parece, quase por magia, amenizar-se, simplificar-se - tudo parece melhor, enfim.
E vimos para casa a pensar numa série de coisas, não apenas no brilhantismo do texto, dos actores (Cintra - Batarda: ora aqui está uma grande combinação), no despojamento lindíssimo da cenografia, mas também em intensidades humanas. Em "Ifigénia na Táurida", é o rei bárbaro que concede a liberdade e o regresso à civilização dos prisioneiros gregos, por exemplo - gostei deste aspecto, fiquei a pensar nisto.
Também já tinha pensado nesta questão da civilização vs barbarismo devido a Medeia, de Eurípides - a figura da mulher bárbara, estrangeira, que mata os próprios filhos, sobre a qual escrevi aqui. Não quer dizer que tenha alguma conclusão relativamente a este assunto, porque de facto não tenho - mas estou a pensar nisto.
E, mais uma vez, os seres humanos andam sempre à volta do mesmo, e a presença dos deuses é inevitável - o confronto, a submissão ou a adoração dos deuses. Tal como em Macbeth (com certeza, tal como em muitas outras peças, mas é Macbeth que me vem à mente), a eterna questão de saber se somos nós que fazemos o nosso próprio destino, ou se são os deuses que o fazem. Por isso gostei da frase que dá título a este post. Faz lembrar o fogo divino que Prometeu rouba aos deuses e que dá aos homens, enfurecendo o mundo divino quando se apercebe que, entre deuses e homens, a diferença já não é muita.
(esqueçamos o que aconteceu ao pobre Prometeu, a águia que lhe comia os intestinos todos os dias, enquanto durante a noite os intestinos se recompunham magicamente para a águia se voltar a refastelar uma e outra vez... deixa lá o fogo em paz, ó Prometeu).

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