terça-feira, 20 de outubro de 2009

Criacionismo (o título deste post engana muito)

- Mas é que tu não percebes - dizia-me ele - ela nem sequer sabia o que era o "criacionismo".
Eu fiquei a pensar na (pobre) rapariga com quem este meu amigo tinha terminado o relativamente longo namoro - não era bonita, mas também não era feia; a seu desfavor tinha o cabelo oxigenado, mas a seu largo favor tinha a inteligência, a simpatia, o facto de ter um cão e de ser DJ nas horas vagas. Mas, pelos vistos, tais predicados não eram suficientes para ele, ainda na ressaca de um divórcio e, pelos vistos, chegando à conclusão que isto de nos apaixonarmos por alguém é mais difícil do que parece; pormenores como este do criacionismo, que não teriam qualquer importância a longo prazo, tomavam uma proporção exagerada naquela fase inicial, em que se decide se se gosta verdadeiramente, ou não, da outra pessoa.
Imagino a rapariga a aprender o que é o criacionismo, mas em vão, porque já é tarde demais; depois, a ler o Crime e Castigo, mas também já vai ser tarde demais; depois, a desfazer-se do cão e a arranjar um gato, mas também já vai ser tarde demais. E enfim. O que queremos nós dos outros, afinal?
Eu acho que queremos muito pouco. Alguém que não nos envergonhe - acho que é o fundamental. Para este meu amigo, a ignorância da (agora ex) namorada era embaraçosa. Para outras pessoas, sapatos com berloque causam um imenso desconforto. Quem souber o que é o criacionismo (nem sei como é que se escreve - tive de corrigir o post porque escrevi "creacionismo") e não usar sapatos de berloque ganha pontos porque, à partida, não envergonha ninguém. Mas isto de não causar vergonhas tem que se lhe diga. É como simpatizar com alguém, tudo muito bem, muito certinho, as coisas certas ditas às horas certas, e depois ouvir "olha, este relatório, fize-o em dez minutos".
Tudo por água abaixo. Este "fize-o" é igual ao criacionismo do meu amigo. Enfim, é assim, a vida traz muitas (des)ilusões, ou por outra: traze muitas (des)ilusões.

1 comentário:

ecila disse...

Por vezes é complicado explicar porque nao nos apaixonamos por alguem que até tem potencial. É complicado de explicar até a nós próprios, quanto mais ao outros. E sao sempre os pormenores que fazem a diferenca ;-)