Sendo uma pessoa que não gosta de futebol nem percebe claramente as regras do jogo, gosto de falar de futebol, e mais, gosto de ir ao estádio (que, para mim, é a Luz, isto é, a Catedral). É uma idiossincrasia contraditória que eu tenho, mas o ser humano é mesmo assim, tem de viver com as suas contradições.
Ora, se há coisa que eu gosto na Luz (sou do Benfica, convém que fique claro desde já), é, em primeiro lugar, da cor. Gosto de vermelho, é uma cor quente; o verde é mais frio. Também gosto de verde, atenção, mas gosto mais de vermelho. Depois, gosto da alegria das pessoas. As pessoas estão sempre tão impossivelmente alegres na Luz que é uma alegria. Em seguida, gosto de cantar aqueles hinos todos, porque é o que de mais próximo eu encontrei de viver algo parecido com aquela série antiga, a Fama, em que as pessoas iam todas para a rua dançar e cantar, com a coreografia certinha e tudo. No estádio também é assim, as pessoas cantam, fazem a onda (sentam-se e levantam-se) a um ritmo impecável e quase musical, e aquilo é uma lindeza. Sai sempre bem sem ninguém ter ensaiado antes, o que só prova que o ser humano, de facto, é intrinsecamente um artista.
Finalmente, aquilo que arrasa quando se vai à Luz é o começo épico do jogo. Eu sinto que, na minha vida, tenho poucos momentos épicos. Aliás, a razão de ter um ipod prende-se com isso, porque se vou entretida a ouvir música, posso sempre imaginar que estou a viver um momento importantíssimo; tudo à minha volta se torna cinematográfico, e a cada passo que dou penso sempre que sou como a Norma Desmond do Sunset Boulevard e que me aproximo, cada vez mais, da câmara de Cecil B. de Mille. Mas, na vida real, não há, verdadeiramente, nenhum close-up nem momentos épicos nenhuns; no entanto, ver a águia (disseram-me uma vez que era um milhafre, e também se for não vejo problema nenhum; os milhafres também têm a sua nobreza), dizia, ver a águia Vitória a sobrevoar o estádio ao som da música, com as fitinhas vermelhas e brancas a esvoaçar, tem a sua grandeza. É bonito de se ver, entusiasma.
De modo que, mesmo que o Benfica perca (o que nunca aconteceu das vezes que fui à Luz; sou uma pessoa que dá sorte ao seu clube), eu fico sempre contente, ou por outra, presumo que fique contente, porque, como disse, sempre que fui à Catedral, o Benfica ganhou; não sei o que é ir à Luz e ver a equipa a perder.
Se eu pudesse andar sempre com colunas de som atrás e ir mudando a música em função dos diferentes momentos da vida, talvez não precisasse de ir ao estádio. Mas, como isso não acontece, vou, de vez em quando, de alegre cachecol, o único atavio a que me permito, fazer a onda, cantar, alegrar-me um bocadinho.
É para isso que o futebol serve, quanto a mim.
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