Uma vez, fui ver esta peça no CCB. Saí de lá muito deprimida. Pensei que a vida, de facto, era um absurdo sem fundo, e que, tal como os outros dois indivíduos especados no palco à espera, eu própria me encontrava a aguardar pelo tal Godot, que, ficara a saber, nunca por nunca chegaria. E que percebia, de facto, porque é que À Espera de Godot podia ser entendida como uma tragédia. Eu, que sempre pensei que a vida era uma espécie de início de festa à qual acabámos de chegar, e em que aguardamos ansiosamente pelo momento em que nos vamos começar a divertir, apenas para acabar tudo e ficarmos a olhar para os copos vazios e perceber que esse momento nunca chegou, eu, dizia, identifiquei-me um bocado com os dois indíviduos à espera de Godot.
Voltei a pensar no tal Godot esta manhã. Chovia, conseguia ouvir o barulho da chuva, e ao contrário do que as pessoas me dizem, não acho o som do matraquear da chuva nada reconfortante quando se está deitado, especialmente se se está em Maio e se vive em Portugal (qualquer dia, nem o clima é justificação de jeito para viver aqui). Fazia vento, também, e ouvia o vento uivante, como diriam as irmãs Brontë, e pensei que a última coisa que queria era levantar-me, a última coisa que queria era ir trabalhar, e também pensei que, se ao menos eu me levantasse e tivesse a garantia de que encontraria o Godot, ainda vá que não vá, mas levantar-me e ficar na mesma, sem encontrar o tal Godot, qual o sentido, porquê, para quê, porquê?!
De modo que estava um bocado deprimida. Talvez por ser segunda-feira, que, a par das terríveis terças-feiras, é dia que me provoca alergia. Mas enfim.
Depois, falei com uma alma amiga que discordou inteiramente da minha opinião depressiva sobre À Espera de Godot. Achou muito estranho eu ter ficado tão angustiada com a peça. "Não percebes que a peça é sobre o optimismo?" Não, realmente não percebo. "Sim, a peça é um aviso para tu levantares o rabo e ires à tua vida como entenderes, em vez de ficares feita parva à espera do Godot. O Godot é um idiota, e os outros ainda mais idiotas são por terem ficado à espera. Como é que não percebeste isso?!"
Realmente. Como é que eu não percebi. A verdade é que nunca tinha percebido, que o meu apego ao pessimismo impede-me de lobrigar certas evidências.
E, assim, talvez À Espera de Godot seja uma peça alegre, e, de cada vez que me lembro dela, deverei, quiçá, mandar o Godot, alegre e optimisticamente, à merda, que eu tenho mais do que fazer do que ficar à espera.
Mas e se qualquer dia chega o Godot e não me encontra, depois como é que é?
2 comentários:
Olha lá, em vez de ficares a pensar no outro que tal ligares a mais amigas e não só a uma para ficares à espera do nada!!! E digo-te mais, gostei muito da peça, a verdade é que o tempo está sempre a passar e temos mais é de viver intensamente cada dia, assim, vais ver, o Godot fica tão chateado que ainda aparece :)
Deixas-lhe um bilhetinho: "Godot, amigo, volto já ou quando me apetecer."
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