quinta-feira, 9 de abril de 2009

A competência cansa

Será que vale a pena perder tempo com coisas que são meramente "competentes"? Lembrei-me disto por dois motivos:

1) este post do LB n'O Nascer do Sol, em que designa, e quanto a mim bem, porque concordo inteiramente, The Dying Animal, de Philip Roth, como meramente competente (e por isso, limitado)

2) programa acerca dos melhores álbuns de sempre (isto é, desde 1981, desde que se criou a MTV) que passou ontem, precisamente, na MTV (pois é, eu sou daquelas pessoas que, no que à televisão respeita, tem um gosto muitíssimo apurado e intelectual). A discussão foi muito fraquinha, mas pronto, eu tenho tendência para gostar destes countdowns e para gostar também de ouvir gente a discutir música, ainda que a discussão seja sofrível.

Ora, muitos dos discos que foram mencionados neste programa não eram propriamente maus, mas meramente competentes, isto é, bem feitos, bem produzidos, bons músicos, cançõezinhas sólidas, letras profundas q.b., mas sem rasgos de brilhantismo. Eu aceito perfeitamente que me digam, "ah, mas nem tudo tem de ser brilhante, brilhantes só os Beatles, os outros fazem o que podem e já não é mau". Eu aceito este argumento. No entanto, a "competência" é uma qualidade nefasta, porque, não sendo a mediocridade, é extremamente entediante. Eu, sinceramente, não sei se prefiro odiar uma coisa por ser medíocre, ou encher-me de tédio com algo que é "competente". Se calhar até prefiro odiar, mas isso sou eu, que sou má pessoa. Admito que não seja assim com toda a gente.

Voltando à questão da competência. Os discos que se discutiram neste programa da MTV, que vale o que vale, não eram maus - Joshua Tree dos U2, Automatic for the People, dos REM. Mas também não são bons-bons-bons, não têm grandes rasgos de brilhantismo, pois não? São competentes, pronto. São discos feitos para o comum dos mortais ouvir e pensar, "ora aqui está música como deve ser, nem muito avant-garde, nem muito pimba, mesmo na medida certa". Pelo menos, é o que me parece, e peço desculpa desde já se estou a ofender alguém, porque sei que há acérrimos seguidores de U2, e de REM também, e que estas bandas têm grande reputação e tal e coisa, mas enfim, não consigo escapar a este sentimento de que a competência é chata, fria, mecânica. Se compararmos Joshua Tree e Automatic... com outros álbuns mencionados no programa, por exemplo Thriller ou Purple Rain, podemos dizer que estes últimos são melhores do que os primeiros? Provavelmene, não. Mas o Thriller e o Purple Rain, talvez por serem menos perfeitos, mais pirosos, mais estridentes e garridos, têm algumas pérolas que ficam connosco e que gostamos de voltar a ouvir, ao passo que coisas como With or Without You, All I want is you ou Night Swimming (esta, em particular, é muito bonitinha) são lindas, perfeitinhas, sem dúvida alguma, mas e depois? A única coisa que me ocorre fazer depois de apreciar a audição destas três músicas, que dou aqui a título de exemplo, e das quais gosto, é encolher os ombros; aquilo que me apetece fazer depois de ouvir o Purple Rain do Prince, por exemplo, é voltar a ouvir aquele grito que ele dá no fim a acompanhar o solo de guitarra. Está giro, o que é que eu hei-de fazer.

O mesmo se passa com certos escritores, ou com certos livros. Há certos livros meramente competentes, que lemos, reconhecemos a (eventualmente grande) qualidade, mas acaba ali. Só me consigo lembrar do Dying Animal que o Lourenço refere no Nascer do Sol, mas há outros, com certeza, tipo Lídia Jorge ou isso. Bonitinho, arranjadinho, sim senhora, mas às vezes a grande marca da imperfeição é que dá o interesse , o "drama", à vida.

Já alguém escreveu sobre a beleza da imperfeição. Não me consigo lembrar quem, o quê. Mas quem quer que seja, concordo com ele/ela. A imperfeição consegue ser uma coisa muito bonita.

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