Este excerto, retirado de um artigo da Slate, é muito interessante, debate o problema das livrarias independentes que lutam pela sobrevivência face à Amazon e ao e-book e tal, mas o que me traz aqui não é esta preocupante problemática. É aquele excertozinho que anuncia que as livrarias são boas para "cruise for a date".
Isto foi coisa que nunca me aconteceu na vida e o meu coração enche-se de pena de mim própria ao admitir isto, porque o meu sonho sempre foi encontrar o príncipe encantado numa livraria. No entanto, nunca, nunca, nunca mas nunca alguma vez encontrei "date" algum numa livraria, e isto agasta-me, porque não consigo imaginar sítio mais encantador e romântico do que uma livraria, ainda por cima com as potencialidades que apresenta de se ficar a conhecer tão bem a outra pessoa. Se o conhecemos na secção dos romancistas russos, por exemplo, há ali pés para andar. Eu nem sequer sou fã acerba dos russos, mas um namorado que conhece o seu Dostoevsky tem classe, há que admitir.
E depois podemos apurar a escolha consoante a livraria de que gostamos mais - se somos mais para o popularucho e queremos alguém que não nos despreze porque de vez em quando lemos porcaria, vamos à Fnac; se queremos um poeta, vamos à Poesia Incompleta; se queremos um alternativo indie, vamos à Buchholz, (continua aberta, não continua? Espero bem que sim) e ainda nem sequer estamos a introduzir a Barata, a Assírio e Alvim, a Babel e outras que não sabe/não responde aqui na equaçãozinha.
Portanto, as livrarias poderiam ser o mais próximo de que dispomos de uma espécie de "pick and choose" no que concerne (não resisto a esta pirosíssima expressão) a namorados e namoradas. De modo que, como se diz no excertozito acima, as livrarias não existem primordialmente para vender livros - pois não, é para conhecermos o Corto Maltese.
No entanto, diz-me a experiência que o Corto Maltese anda por aí em aventuras e em livrarias é que ele não está. O mais próximo que estive de conhecer um "date" numa livraria foi uma vez em que estava a comprar um livrinho, muito interessante por sinal, de Nick Danziger (este - de facto, era mesmo para impressionar o indígena, ah ah). O rapazinho que estava a atender era da minha idade e, também por sinal, bastante agradável ao olhar, e ficou a mirar e a remirar o livro, disse-me que era uma escolha fantástica, e se eu era fotógrafa. Eu, parva, respondi com a verdade e disse que não. Ainda ficámos ali uns minutos a falar de fotógrafos de que gostávamos, mas a coisa ficou por ali. Que desilusão.
Porque é que a vida não está nos livros? Porque é que a gente não há de ir a uma livraria e escolher a pessoa acertada para nós com base naquilo que ele lê, quando este é um critério tão agradável, tão simpático, tão importante? E, sendo um critério tão agradável, simpático e importante, porque é que nunca se conhece ninguém de jeito nas livrarias? Eu, pelo menos, nunca conheci. Já sei, o defeito é meu.
De qualquer forma, para mim é tarde demais. A vida já me disse que o Corto Maltese não é para ser encontrado em livrarias.
Mas, para quem não for ainda tarde demais, eu desejo não só um feliz Natal como um excelente Corto Maltese (versão feminina e/ou masculina) numa livraria perto de si.