quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Ficções

As pessoas gostam de criar ficções, ou porque são escritoras e ganham a vida assim, e quem me dera a mim, portanto tudo bem, ou porque não conseguem viver sem uma narrativa que lhes justifique os problemas, as paranóias, as óbvias ilusões. Construímos sempre narrativas, encaramos a vida como uma longa história que começa no dia em que nascemos, Paul Ricoeur escreveu sobre isto, julgo, e a ficção faz parte de contar uma história, portanto ninguém nos pode levar a mal se, lá pelo meio, quisermos explicar o nosso mau humor com um "ah, o meu pai batia-me quando eu era pequena", mesmo que isto não seja inteiramente verdade, mesmo que isto tenha sido, na realidade, umas quantas admoestações ríspidas, uma palmada no rabo, mas é o que basta para eu extrapolar, dizer que me bateram quando era criança, porque se não for assim não há nada que justifique, que explique, que torne este meu mau humor inteligível, aceitável, e se nada houver que o justifique, e a única explicação for "eu sou assim porque sou má pessoa", sem atenuações, sem nada, aí eu teria de aceitar quem realmente sou, nada a fazer, ser humano de má qualidade.
E isso a gente não consegue. Os espelhos são sempre os nossos piores inimigos.
É por isso que eu gosto muito de maquilhagem, e uso desde os meus 15 anos, mais ou menos. 

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