terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Tomar café: arrebita, espevita e evita (o divórcio).

Em Comedians in Cars Getting Coffee, Jerry Seinfeld está à conversa com o seu amigo de longa data, Larry David, em que este fala do seu divórcio e diz que uma das razões pelas quais a ex-mulher se desinteressou consiste no facto de ele, Larry David, ter parado de beber café. A ex-mulher queixava-se muito, e argumentava que "agora nem sequer podemos partilhar um belo café de manhãzinha", ao que Larry David respondia "mas eu continuo a beber coisas de chávenas! O que é que interessa se é café ou não é café, o que interessa é que eu estou a beber duma chávena. Tu não sabes o que está cá dentro, pode ser qualquer coisa". 
O raciocínio de Larry David faz sentido, mas devo dizer que concordo com a ex-mulher. Tentar tomar café com alguém que não toma café é uma batalha inglória, uma desilusão insuperável. Vai-se ao café, pede-se um café, e a pessoa que está connosco pede "um chá". Eu adoro chá, mas chá não tem nada a ver com café. Em primeiro lugar, o chá demora mais tempo a beber do que o café; mesmo que a pessoa peça uma meia-de-leite, que tem mais consistência, um chá demora sempre mais tempo. Acabamos o nosso café e ficamos ali parados à espera que a outra pessoa sopre o seu chá quente, beberique, e finalmente termine, para podermos dar andamento à conversa ou irmos a outro lado qualquer; em segundo lugar, se tomamos café em casa, depois de uma refeição, quem não bebe café não nos acompanha, e tomamos café sozinhos, ou então voltam a insistir no chá, e o problema repete-se. E depois há sempre aquela sensação de o chá ser uma bebida mais maricas do que o café. Vão duas amigas ao café, uma pede café e a outra pede um chazinho. A que pede o chazinho fica sempre na mó de cima porque o chá é mais mariquinhas e, consequentemente, acarreta sempre um certo ar de classe. Muito injusto.
Além de todas estas razões que enunciei, acresce que não faz sentido finalizar uma refeição com chá, tem de ser sempre café. E com este café final vêm também as observações finais da conversa que se estava a ter, as conclusões felizes, e assim termina uma etapa da vida, seja almoço, seja jantar, seja um simples lanchinho. A falta de café impede esta necessária conclusão. 
De modo que as pessoas, em geral, talvez se possam dividir entre pessoas-café e pessoas-chá, mesmo que apreciem as duas coisas. Eu, como já disse, gosto muito de chá, faço litros de chá para ir bebendo ao longo do dia (não se pode fazer isto com café, é bem verdade), mas sinto-me uma pessoa-café, porque não passo sem um cafezinho para arrebitar, para espevitar uma boa conversa. O café arrebita e espevita, dois predicados espectaculares que o chá, por mais cafeína que tenha, que a tem, não fornece. 
Daí que o Larry David, infelizmente, tenha merecido o divórcio que a mulher lhe pôs em cima. Ninguém o mandou armar-se em saudável e prescindir de um bom café.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

A qualidade que resiste ainda e sempre ao invasor

Há um certo argumento quantitativo que me irrita bastante, mormente porque discordo absolutamente dele mas não tenho inteiramente a certeza de estar errado. Isto é muito desconcertante.
Por exemplo, quando passava aquela série, Friends, costumava dizer-se que "40 million viewers can't be wrong"; havia quem criticasse a série (eu, por acaso, achava bem gira), e que uns quantos pobretanas não podem viver em Nova Iorque com um estilo de vida tão bom, e que não era realista, e que além disso era tudo filmado em Los Angels, e etc. e tal, e respondia-se a isto com o tal argumento da quantidade - se há tanta gente que vê o programa, seguramente que haverá algo de qualidade no mesmo. Como se a quantidade acarretasse, por si só, a qualidade.
Recentemente, ouvi argumento semelhante relativo ao livro 50 Shades of Grey. Estava a falar disto com alguém, entretida nas diatribes do costume, "bem, eu nunca hei-de ler o livro, já se sabe que é uma grande merda, e a mulherzinha que o escreveu é uma bimba que nem ler sabe e etc. e tal", e respondem-me, "dizes isso, mas há milhares de pessoas que leram o livro e que gostaram. Essa bimba deve estar a fazer qualquer coisa bem".
Fiquei desconcertada com isto. É que fiquei mesmo. Por um lado, diz-me o coração que este argumento está profundamente errado - o Van Gogh, por exemplo, nunca vendeu nenhum quadro na vida, não apelava às massas, e se este tipo de lógica da quantidade lhe tivesse ocorrido, com certeza que em vez de uma orelha cortava logo as duas, mas era. Por outro lado, o mesmo Van Gogh, hoje em dia, goza da sua merecida glória, tornou-se um artista reconhecido pelas massas, e o mesmo se pode dizer de outros artistas soberbamente bons a quem o tempo, acompanhado pela quantidade, isto é, pelo número de pessoas que os reconhecem, fez justiça. E será verdade que, fosse o 50 Shades assim tão mau, haveria tal número de pessoas a lê-lo e a apreciá-lo?
Haveria, sim, Haveria porque aquilo a que a contemporaneidade presta atenção é, muitas vezes, lixo do qual ninguém se lembra daqui a dez ou vinte anos. O facto de toda a gente ler o livro da tal bimba não quer dizer nada (se percorrermos a lista de best-sellers e, até, de poetas laureados em Inglaterra ao longo do século XIX, por exemplo, verificaremos que hoje em dia ninguém se dá ao trabalho de ler metade). Se, porém, ainda houver muita gente a ler o livro daqui a cem anos, talvez isso signifique alguma coisa "no que concerne" à qualidade do mesmo livro. 
De modo que a conclusão que eu retiro de tudo isto é que esta história da petição absurda contra o abate do cão que matou um bebé não quer, felizmente, dizer grande coisa. Há idiotas em todo o lado que, como diz o Ricardo Araújo Pereira, gozam de liberdade de expressão para a gente os poder identificar e ficar a saber que são idiotas. A quantidade de gente que assina a petição não muda as leis gerais e abstractas que nos regem, nem muda o valor absoluto da vida humana. A qualidade resiste à quantidade. Por enquanto. 

Melhor Blogger Hipotético: Branwell Bronte

January 1834

Dear Diaree,

heloow. My name is Branuel. I am seventeen ears old. I am a writer and an arteest. My phather says I am very tallented. My aunt says I am very tallented. My seesters says I am very tallented. I am will be Poete Laureated just like Meester Robert Southey. 

February 1834

Dear Diaree,

Today I paint a portrayt of my seesters. They are called Charlott, Emilee and Anne. They says I am very tallented. They like the portrayt a lot. I didnt not like it, thou. I erase my own figure from the portrayt becose today I feel very uglee.

January 1835

Dear Diaree,

I apply to the Roial Academee of Arts to become an arteest even more. I am will be there briliantest   student. 

February 1835

Dear Diaree,

The RCA didnt not accept me becose they are stoopid. Today I drink a lot becose I feel very uglee. But my seesters says I am very tallented. My phather says I am very tallented. My aunt says I am very tallented. Our dog Keeper says I am very tallented.

sometime in 1843

Dear Diaree,

Today I got a girl-friend. She is my friend. She is very, very prettee. I like her a lot. She is called Lydia. Thats the beautifulest name in the world.

sometime in 1845

Dear Diaree,

Today I was fired by Meester Robinson. Meester Robinson is husband of Lydia. He hates me. He says I be will never see Lydia again. He makes me cry a lot. He is very mean.
Today I drink a lot becose I feel very uglee. 
I wrote a poem to Lydia. It says,  And heres to you, Mrs Robinson. Jeesus loves you more then you will know, oh, oh, oh. And so do I, I, I. 

Everybody says I am very tallented. I dont not feel tallented. I feel very uglee. 

Quando as expectativas dos outros são muitas, o corpo é que paga. Sempre simpatizei com o Branwell.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

A etiqueta, quando nasce, é para todos

Há uns anos, li um artigo sobre prisões privadas no UK, que eu nem sabia que existiam - na altura, não sabia que existiam nos EUA, quanto mais no Reino Unido. Só o conceito foi suficiente para me arrepiar, mas continuando, estava eu a ler este artigo e dizia-se que os guardas prisionais tinham notado muita diferença no comportamento dos reclusos quando se dirigiam a eles aplicando as estratégias gerais do que normalmente consideramos "delicadeza" - tratavam-nos por "senhor", falavam-lhes com voz calma, nunca recorriam a insultos, enfim, adoptavam um comportamento linguístico em tudo equivalente àquele que adoptamos em sociedade, com pessoas que não estão presas. Os resultados, ao que parece, foram (tempo pretérito, porque o artigo data de 2001) os seguintes:

 "As soon as the cons get out of the van, they're greeted with a 'Good morning, Mr Smith, would you like to come this way?' They're reminded that they're people first and prisoners second. Their whole demeanour changes. They're polite in return to the staff, and each other!"

Mais recentemente, vi um gráfico engraçado sobre a história do metro de Londres, onde se diz que as agressões aos trabalhadores do metro diminuem consideravelmente quando se passa música clássica nas estações ou carruagem. Também encontrei um outro artigo engraçado que explica como programas musicais, em que os presos ouvem ópera, aprendem música, a cantar e a dançar, ameniza grandemente o seu comportamento agressivo e contribui, em geral, para uma melhor reabilitação.
Eu só acho que é uma pena que este tipo de experiências se apliquem apenas às prisões ou ao metro, e não sejam mais generalizadas. Eu, por exemplo, bem precisava de uma reabilitaçãozinha, porque o meu humor tem andado muito em baixo e qualquer dia ainda me leva ao crime.   Não me importava de trabalhar ao som de uma operazita, coisa que talvez me ajudasse. E que tal música clássica nas escolas, por exemplo? Tudo a dar aulas ao som da Flauta Mágica - de certeza que os resultados seriam notórios e benéficos. E, por exemplo, que tal obrigar as pessoas a falar sempre de forma calma e ponderada em público, evitar gritar asneiras em alto e bom som à frente de estranhos, e mesmo na fila de supermercado do Pingo Doce, com os carrinhos cheios de descontos a 50%, lembrarem-se de que são pessoas primeiro e compradores depois? Era giro.
Para rematar, que fique claro que não defendo prisões privadas (há casos de juízes subornados para atafulharem estas prisões de gente, condenando arguidos a torto e a direito - nojo); isto da delicadeza é mais complexo do que parece, e não podemos ignorar que, muitas vezes, a chamada "etiqueta" é convenientemente manipulada para restringir o acesso a determinadas falanges sociais (perguntem a um inglês como se comem ervilhas, ou se o leite se verte na chávena antes ou depois do chá, e logo percebem de que estou a falar). Há que levar tudo com uma pitada de sal, como dizem os mesmos ingleses.
E agora vou acabar, porque ando aqui às voltas há que tempos e não consigo escrever uma conclusão de jeito. Boa noite.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

"Não" é "não"

Há uns tempos, vi uma entrevista com a Pilar del Rio naquele canal Q, que eu por acaso pensava que era chico-esperto, mas afinal até tem coisas bem giras. Continuando, a entrevista foi interessante, e a uma certa altura ("a páginas tantas", como exemplarmente se diz) o entrevistador pergunta a Pilar, muito lamechamente, se considera que um dia, daqui a muitos anos, vai voltar a encontrar Saramago, vão voltar a estar juntos, enfim, aquele discurso pateta da vida depois da morte. Pilar levou a pergunta muito a sério e respondeu, de forma grave, com as seguintes palavras (cito de cabeça, não foi exactamente assim) "não. Nunca mais nos vamos voltar a ver. A morte é assim".
Eu fiquei aterrada com a força daquele "não", e aterrada a pensar em como se pode viver com isto, com a certeza dum "não" assim - nunca mais nos vamos voltar a ver. 
Ainda estou a pensar.
Vou fazer anos em breve, e pela primeira vez desde há muito, não estou com nenhum drama ontológico relativamente à minha idade avançada, e que ainda me falta cumprir tanta coisa, e assim e assado. É que, por acaso, não acho que me falte cumprir assim muito mais do que já cumpri. Não que tenha feito muuuuuuuuuuita coisa na vida, mas estou satisfeita com o que fiz, e portanto tudo o que o mundo me quiser dar é um bónus, tipo Marco Aurélio.
Sempre a ganhar. 
O que quero mesmo, no entanto, é um grande bolinho de chocolate com chantilly. Isto é que já não é muito Marco Aurélio. 

O passado é um país estrangeiro, e ainda bem

Uma vez, quando teria mais ou menos quinze anos, um amigo dos meus pais fez-me aquela conversa do costume, "então a escola, tens boas notas, gostas?", e etc., e eu disse que sim, que gostava muito, principalmente por causa dos amigos.
"Dos amigos?!", perguntou ele, subitamente muito espantado. Dos amigos, sim, respondi eu. E porque é que os amigos são tão importantes?, voltou ele a perguntar. E eu fiz o palavreado do costume, "porque conversamos, discutimos coisas, apoiamo-nos se estamos a passar fases más, eu-adoro-os-meus-amigos-vão-ser-meus-amigos-para-sempre". Ele olhou para mim e, pausadamente, disse, "uma coisa é ter amigos, outra coisa é viver através dos amigos. Às vezes, não é bom termos amigos assim tão fortes. Arriscamo-nos a ver o mundo através dos olhos deles". 
Ele era daquelas pessoas que fazia afirmações destas, que nos deixavam a pensar, e depois voltava a falar das coisas mais normais possíveis, de modo que a conversa acabou mas eu fiquei ali a matutar naquilo. 
Na fase da adolescência, os amigos assumem um papel desmesuradamente grande na nossa vida. É ir para todo o lado com os amigos, telefonar aos amigos, saber o que os amigos estão a fazer, de quem gostam, de quem não gostam, sentir que o mundo é nosso. A mim nunca me tinha parecido que via o mundo através dos olhos dos amigos, mas comecei a pensar que isso era uma possibilidade. E ainda acho que é.
É claro que a solução não é não ter amigos, nem este post se destina a desvalorizar a amizade. Aquelas amizades que nós sentimos que são para a vida são imprescindíveis, essenciais, necessárias. Apenas me parece que, às vezes, aquilo a que chamamos amizade não é bem amizade, talvez seja apenas necessidade de não estarmos sozinhos. Depois os anos passam, e verificamos que aquelas pessoas, de quem pensávamos precisar tanto, não têm nada em comum connosco, pior - nunca tiveram. Os momentos partilhados na intensidade da adolescência eram apenas motivados por alguém que tinha necessidade de falar e de se fazer ouvir e por alguém que tinha necessidade de ouvir ou de se sentir útil (e vice-versa). 
E porém, eu tenho a sorte de ter mantido grandes amizades vindas da adolescência; sei que não vivo sem elas, e isto porque não sinto que essas pessoas, minhas amigas há tantos anos, queiram impor uma qualquer visão do mundo só porque é dessa forma que se sentem melhor. Somos amigos porque gostamos uns dos outros, pronto.
Tive, também, a tristeza  de verificar que, por mais esforço que faça, a magia já não se dá com outros por quem tinha afeição há alguns anos. De modo que deixo de fazer esforço e verifico que vivemos mesmo em mundos diferentes. Win some, lose some, como se diz em estrangeiro. E ainda bem que as coisas se tornam claras, porque às vezes temos de perceber que não é só porque conhecemos alguém há anos que vamos formar uma aliança que dure para sempre, embora às vezes se ande ali a insistir sem ter pés para andar, e que as pessoas que conhecemos há menos tempo, na idade adulta, são mais próximas de nós e essas sim, essas vão ficar para sempre. E isto sabe tão bem. 
O Go-Between começa com uma frase que se tornou antológica, talvez por ser tão verdadeira, e que eu ando sempre a citar, para dar ar de esperta: "the past is a foreign country. They do things differently there". A vantagem dos países estrangeiros é que a gente não tem que os visitar se não quiser. 

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

O Narciso era um bocado parvo

A BBC News tem um artiguinho interessante acerca do crescente narcisismo da juventude, e de como uma auto-estima exagerada não conduz necessariamente ao sucesso, acabando até por ser contra-producente. Faz-se um estudo interessante sobre pronomes pessoais, dizendo-se que se tem revelado uma tendência para os usar cada vez mais em número singular (eu e respectivas declinações), e cada vez menos em número plural (nós e respectivas declinações). Também se diz, a certa altura:


Num país em que se fala tanto dos portugueses que gostam de viver acima das suas possibilidades, teremos de confessar que a afirmação acima é um tanto ou quanto verdade. Não que eu defenda esta tese parva de que todos os portugueses, tradicionalmente pobres e com vidas difíceis, tenham vivido anos que nem burgueses rotundos, mas parece-me porém verdadeiro que temos uma certa tendência para o espalhafato e para gastar dinheiro em carros e telemóveis que não podemos pagar. E isto constata-se igualmente na minha geração, que deveria ser mais esperta do que a anterior, mas não é. Creio que as pessoas da minha idade, como já li algures, foram as primeiras depois do 25 de Abril a usufruir de um verdadeiro conforto material, aproximado da classe média americana - frigoríficos a abarrotar de Coca-Cola, despensa com bens inúteis e de terceira ou quarta necessidade tipo bolachas recheadas ou batatas fritas sabor a presunto, pares de sapatos que se compram não porque os pés precisam de ser aquecidos, mas porque precisamos de usar "coisas bonitas", férias lá fora, televisão com séries a mostrar o mundo novo dos adolescentes anglo-saxónicos, com dinheiro no bolso para compras de impulso, universidade para as massas, e etc (atenção: estou a falar em geral). E talvez isto tenha contribuido para uma determinada pré-disposição face ao mundo, uma certa ideia de que é preciso trabalhar, sim, mas apenas q.b., porque nascemos com direito natural a determinado conforto, mercê da nossa espectacularidade inata.
Institivamente, porém, sabemos que as coisas não funcionam assim e que o mundo se está absolutamente a marimbar se nós cá estamos ou não. A geração que sucedeu a minha parece-me ainda pior nesta coisa do narcisismo (discurso à Velho do Restelo, eu sei), e isto porque estão ainda mais habituados a dinheiro, a conforto, a famílias mais pequenas em que eles são o centro, e qualquer tipo de esforço que se exija deles é uma espécie de ofensa à sua inexpugnável inteligência. Tão inexpugnável, na verdade, que às vezes a gente nem nota que ela lá está, mas isso é outra conversa. 
Lembro-me de ter assistido a uma comunicação numa conferência em que uma académica chinesa estuvdava, precisamente, as diferenças de uso nos pronomes pessoais e de elogios antes e depois da política do filho único na China. A diferença era absolutamente impressionante - a geração pré-filho único tendia ao "nós" e agradecia elogios, ao passo que a geração pós-filho único tendia ao "eu" e recebia elogios como se estes fossem verdades insofismáveis - em vez do "obrigado", diziam "eu sei" em resposta, por exemplo, a um comentário como "essas calças ficam-te bem". 
E não posso deixar de pensar que o artigo da BBC também poderia descrever, com alguma precisão, a proliferação de blogues, nomeadamente blogues das chamadas "fashionistas", que pululam em Portugal. Não me excluo disto, também tenho um blogue, e talvez haja de facto um certo narcisismo inerente a quem se dispõe a vir para a internet amandar bocas (expressão que eu adoro) ou falar da vidinha. Eu faço ambas as coisas, e portanto mea culpa, mas mesmo assim há casos piores do que o meu, em que a vida é toda ali escarrapachada, acompanhada por sapatos e malas e roupas, e toda a gente vive bem com isso, com esse excesso de auto-estima, esse exagero de exposição. E com o mal dos outros posso eu bem, como se diz na nossa querida língua portuguesa.
São vidas, pronto. A ler o artiguinho da BBC, porque esta coisa do narcisismo, parece-me a mim, há-de ter consequências bem nefastas, como teve, aliás, para o Narciso. Os Gregos é que sabiam, pá.

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Feliz 2013

Às vezes, há coisas a superar que têm de ser vencidas, e não sabemos bem porquê. Tem de ser e pronto.
Lembrei-me disto por ter estado hoje a falar do Moby Dick e do Velho e o Mar, em que a luta física, mental, a força da batalha e o imperativo de vencer e de conseguir são essenciais e absolutamente necessários. E certas coisas da vida também são assim, e nem sabemos explicar porquê, mas há qualquer coisa que nos diz que tem de ser, mesmo que racionalmente não o saibamos explicar.
Deixar um emprego que não nos faz feliz.
Recusar algo que parece uma grande oportunidade mas que sentimos que nos vai fazer miseráveis para o resto da vida. Nem sempre aquilo que parece o bom caminho é verdadeiramente benéfico, e o que interessa é uma estrada com espaço para andar, não um passeio pavimentado e aparentemente fácil que desemboca num beco sem saída.
Aprender que há pessoas, coisas e lugares que não nos fazem bem e saber cortá-los da nossa vida, ficando assim com muito mais tempo e energia apenas para aqueles de quem gostamos, aqueles que valem a pena.
Qualquer coisa assim. Tem de ser e pronto.
De modo que os meus votos para 2013 são mais ou menos isto que acabei de dizer - que todos consigamos ser como o Velho do Velho e o Mar ou como o Capitão Ahab (que aparentemente não conseguiu, mas na verdade, acho eu, conseguiu muito).
Feliz 2013.