Eh pá, estou tão farta de ouvir dizer (ler, para ser mais precisa) que a Mrs Danvers estava apaixonada pela Rebecca, e que a sua devoção por esta última era um grande subtexto para demonstrar uma relação lésbica e etc. e tal.
Ao ler o livro, conseguimos perceber que Rebecca era um espírito muito livre, muito dado à rambóia, e que provavelmente não lhe interessaria distinguir entre homens e mulheres, desde que se divertisse com um ou com outro. Fala-se imenso da possível bissexualidade de Rebecca, e penso que o livro o dá de facto a entender.
Mas o caso de Mrs Danvers é inteiramente outro. A sua história com Rebecca é uma história de amor profundo, sim, mas o que me parece óbvio é que é de amor maternal que se trata. Quando Rebecca morre, Mrs Danvers perde a sua única filha, a única pessoa que ela amava mais do que tudo, por quem daria a vida, a pessoa que justificava a sua própria existência. O ódio, a amargura de Mrs Danvers, aquilo que a encerra numa morte em vida vem do facto de ter perdido aquela a quem queria como uma verdadeira filha.
Não admira que ela passe o livro todo em esquemas odiosos, a tentar tramar a pateta da segunda Mrs de Winter (ai, meu Deus, tenho sempre uma vontade tão grande de lhe pregar um tabefe para ver se lhe dá a espertina!). Mrs Danvers tem de recuperar, sozinha, da morte da filha e ainda tem de aturar uma tonta que casa com o marido da filha, que vem ocupar o lugar da filha, e que ainda por cima é uma mosca morta que não sabe o que há de fazer à vida (e está viva, ao passo que Rebecca está morta).
Isto tornou-se claro para mim ao ler aquela cena, tremenda, em que a segunda Mrs de Winter encontra Mrs Danvers no antigo quarto de Rebecca (preservado como no dia da sua morte) e ela, Mrs Danvers, depois de destilar toda a sua fel, começa a chorar, de boca aberta, sem lágrimas. Este "choro seco", como é descrito no livro, pareceu-me condensar um sofrimento horrível, insuperável, de quem perdeu uma parte de si, um filho. Horrível.
É só isto.
4 comentários:
Eu tenho o Kobo, gosto e acho que voltei a ler mais desde que o tenho. Gosto de sublinhar e agrada-me essa facilidade. Do que não gosto é da dificuldade que tenho em encontrar e escolher livros, se calhar falta esse contacto físico de folhear as páginas, ler parágrafos soltos e ficar curiosa.
do que você está falando afinal? quem são essas pessoas?
Maariah, eu admito que seja falta de hábito. Talvez tenha de insistir mais. E nem me tinha lembrado disso, da dificuldade em encontrar livros em formato electrónico... mais outro motivo que me desmotiva. :D
Jamil, estas pessoas são personagens de um livro chamado Rebecca, da Daphne du Maurier. Eu adoro o livro e estou sempre a falar dele, daí o título do post. Percebo que comece a tornar-se confuso...
De qualquer forma, o Hitchcock fez um filme baseado no livro e tudo. Não vi o filme, mas o livro posso assegurar que é espectacular. Eu, pelo menos, acho mesmo que sim.
ok, rita, anotado, verei se encontro por aqui pra comprar, eis que me interessou; quanto ao filme, provavelmente o assistirei depois que ler o livro (fiz assim com 'a insustentável leveza do ser' recentemente).
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