Às vezes penso no que é preciso ser ou fazer para ser daquelas pessoas inesquecíveis. Aquelas de quem ninguém se esquece. Eu não sou nada assim, eu sou esquecível. Sou tal e qual o Kevin Spacey no American Beauty, quando é apresentado pela segunda vez a um parvo de um convencido de um agente imobiliário, que não se lembra dele. E diz o Kevin Spacey, "ah, não se lembra de mim? Deixe estar, se eu fosse a si também não me lembrava de mim". Observação arguta, sardónica e muito realista. E poderíamos continuar nos adjectivos, mas agora não apetece.
Bom. Lembro-me de uma vez, há muitos anos, ainda eu era uma miúda livre que saía à noite, e de ter precisamente saído com um amigo, que ainda hoje é meu amigo, embora já não saiamos. Eu aburguesei-me, mas isso é outra conversa. Continuando, esse meu amigo apresentou-me a um outro amigo. Era alto, de brinco na orelha, cabelo encaracolado, muito simpático. Lembro-me de pensar que queria mesmo que este indivíduo ficasse com tão boa impressão minha como eu imediatamente tive dele, mas acho que o desiderato, lamentavelmente, não se concretizou. Não que eu não tivesse uma conversa interessantezinha, porque acho que até tive (quer dizer, era composta). Não porque estivesse mal vestida ou mal arranjada, porque até acho que nem estava - além de ter metade das protuberâncias rubenescas dos dias de hoje, lembro-me perfeitamente que estava a usar um casaco azul vintage, giro, giro. Mas não se deu o clique, não deu. Por mais que me esforçasse, havia ali qualquer coisa que não resultava, uma conversa mole que andava em círculos, e eu frustradíssima, e quanto mais frustrada pior a converseta me saía. Não houve nenhum escândalo nem vergonha nenhuma, apenas uma coisa derretida, sem piada, que ainda é pior. Ao menos, que a pessoa se possa entreter com uma boa escandaleira que a faça rir passado uns anos. Nem isso.
E isto é um exemplo que eu tomo como paradigmático. É como diz o Bukowski, não vale a pena tentar (a Wikipedia diz que ele disse isto). Olha, paciência. Eu, se fosse eu, também não me lembrava de mim.
Mas o casaquinho vintage, esse sim, vale a pena recordar. Por onde será que ele anda?
2 comentários:
Quem escreve um texto assim não pode ser esquecível tão facilmente...
Concordo com a Jamil. ;) (e eu, por exemplo, lembro-me de ti!)
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